terça-feira, 16 de novembro de 2010

Que o teu afeto me afetou é fato...

Ariano Suassuna veio há uns dois anos a Maceió para proferir uma palestra e terminou contando histórias e mais histórias. Como exímio contador que ele é, começou com o emblemático comentário: "porque vocês sabem, né? O que é bom de contar, é ruim de passar. O que é bom de passar, é ruim de contar". Nem a minha memória seletiva que, aos 22 anos, já beira a me falhar mais e mais, conseguiu esquecer seu cabeçalho e o reproduzo vez ou outra por aí - com a devida autoria, evidentemente.

Como nunca a utilizei neste blog, então o faço agora.
Fato é que é muito mais fácil falar sobre decepções amorosas, amores platônicos, proibidos, irrealizaveis, traições, paixões não correspondidas, quedas bruscas, perdas e até morte. É mais fácil chegar aqui e metaforizar com toda profundidade e verdade do mundo sobre os casos suspensos que corroem nossa calmaria e põem à tona a nossa inquietude. O desafio é falar da alegria. Falar da paz sem parecer piegas. É a coisa mais difícil do mundo, aos acostumados e até felizes com uma vida pessoal ininterruptamente mal resolvida, levantar a bandeira branca e revelar: estou realmente satisfeita com meu relacionamento.

Já provei do veneno doce da poesia que idolatra uma vida infernal com gotículas de céu. Eu não conseguia aceitar uma vida simples, ou a felicidade embaixo do meu nariz, porque não era aquela a felicidade que eu idealizava. Eu não estava feliz e joguei tudo para o ar. Capturei Luis Fernando Verissimo e transformei a arte de defenestrar [leiam o texto dele] numa espécie de etapa permanente da minha vida. Qualquer coisa que não ia bem como eu imaginava, era essa a solução: jogar pela janela.

Joguei muita coisa que não valia a pena, mas joguei muita coisa importante também, porque acreditava ser entulho.Belo dia me joguei pela janela e aí percebi: tem algo errado por aqui. Usar a mesma fórmula para os relacionamentos diiferentes não funciona, seja ela qual for. Nem todas as vezes estou para relações intrigantes e intensas, porque o que me faz querer alguém não é apenas a instabilidade de tê-lo. As vezes é só ele e o quanto ele me faz bem, feliz, completa, que é o que importa.

Mas as perguntas martelam com força: afinal, o que vi nele? As pessoas perguntam ou me saltam olhares questionadores que dizem a todo momento: ele não faz seu tipo, aqueles 'intelectuais'. Eu dizia a mim mesma: ele realmente não faz. Ele não pensa em coisas grandiosas ou grandiosamente malucas, como se mudar para o Haiti para trabalhos inteiramente voluntários. Ele não lê o que eu leio, embora goste de ler e, de fato, não faz o perfil 'intelectual' que as pessoas tanto insistem em dizer. Por Jah, ele nem me deixa insegura, nem me envia músicas e poemas impressionantemente originais. Ele não me impressiona e não me dá calafrios. Nem comodismo ele traz, já que não sou chegada a coisas que não incomodam.

Ele diz piadas sem graça, mas ri de si mesmo e não se leva tão a sério. Quando quer se declarar, não é com música de Vander Lee ou Pato Fu - ou qualquer uma do momento, vai -, mas chega perto, faz uma careta estranha e discreta e diz que me-ama-e-está-completamente-apaixonado-por-mim. Exatamente nestas palavras, nesta ordem, com este clichê, mas com um olhar de 'fui realmente fisgado' que me faz derreter como picolé na praia. Ele nem sempre acompanha meu jeito rápido de pensar e de falar quando estou nervosa ou empolgada, mas não me deixa ficar chateada com ele por muito tempo, nem que precisemos de umas seis horas seguidas de D.R para resolvermos nossas inúmeras diferenças. Mas, calma, não sou tão chata assim... hehue

Ocorre que ele me faz feliz por um caminho que eu não tinha ido até então: pela simplicidade. E mesmo sendo simples, há nele tudo o que eu quero, todas as portas que podem fazer com que sejamos sempre novidade um para o outro. Porque há vontade - de ambas as partes- para que tudo dê certo. Ele me faz feliz pelas ideias mirabolantes que temos, e por levá-las a sério traçando até metas para chegarmos lá. Ele me faz feliz só pelo jeito de me abraçar e de ater-se a alguns detalhes que sempre nos renovam. E me faz feliz pela paciência que tem comigo e pela forma independente e, ao mesmo tempo, presente, com que estamos juntos. Ele não me faz feliz pela ideia que tenho dele, por idealizações, imaginações, mas pelo que ele me faz sentir. Não pelo intelecto, mas pela criatividade.

Ele me faz ficar feliz sem motivos, e por motivos perfeitos, intensos, leves, que me fogem ao pensamento agora...Aliás, talvez nem passem perto do pensamento. Porque, sabe como é... o que é bom de passar...

Nenhum comentário:

Postar um comentário